Queijo Reino
O Queijo Reino é com certeza o primeiro produto lácteo brasileiro que se confunde com os primórdios da industrialização profissional de laticínios do país. A cronologia da produção de leite no Brasil é bastante simples e se inicia praticamente no inicio da colonização, após o descobrimento e se intensifica no ciclo da mineração os quais há registros da introdução do queijo “mineiro”, uma adaptação dos queijos produzidos na região da Serra da Estrela, Portugal. O queijo de Minas consolida-se aos passos e caminhos da estrada real, percurso que ligava os portos do Rio de Janeiro às terras ricas das minas gerais, a partir da descoberta das minas de Ouro Preto e mais adiante das Minas do Ouro do Sêrro Frio e Tucambira, mais tarde Arraial do Ribeirão das Lavras Velhas, declarada em 1729 oficialmente Arraial do Tejuco, Comarca do Serro do Frio, futura Diamantina.
Na segunda metade do século XIX, o gado Holandês é introduzido na raiz da serra da Mantiqueira, atual região que engloba municípios como Antônio Carlos, Barbacena, Santos Dumont, Bias Fortes, utilizando o vocabulário atual, pelo empreendedor português, Carlos Pereira de Sá Fortes.
O Queijo do Reino surge originário do holandês Edam introduzido pelo mestre queijeiro Alberto Boecke, um holandês que vislumbrou a região da Mantiqueira como uma região propicia para produção de queijos. Boecke associou-se a Sá Fortes resultando em 1888, na primeira fábrica de laticínios do Brasil, a Companhia de Laticínios da Mantiqueira, com equipamentos importados da Holanda e introduzidos pelos ilustríssimos mestres queijeiros Gaspar Jong, João Kingma e J. Etienne, os quais ficam raízes definitivas no Brasil. A origem da expressão “do Reino” era corriqueira e atribuída aos produtos oriundos de Portugal, via de importação de grande parte do que se consumia no país. O tradicional processo de embalagens em latas de folhas de flandres atribui-se ao fato de que os queijos viriam para o Brasil em porões de navios e, portanto, a embalagem na lata os protegeria durante o longo percurso de travessia do Atlântico.
Até pouco tempo, nos tempos atuais, os métodos de produção continuavam intocáveis, com a utilização de “soro fermento”, princípio ativo da fermentação lática e formação das características (atribuídas a cepas nativas) somadas ao processo de maturação em temperatura ambiente (20 a 22ºC), por um período de até 90 dias. Atualmente devido a um maior cuidado na produção de alimentos, visando principalmente a segurança alimentar, inúmeros ajustes e adequações tiveram que serem implementados, provavelmente descaracterizando um pouco o tradicional Queijo do Reino. Com certeza é na região do começo das Vertentes com a Zona da Mata Sul em Minas Gerais, onde se elabora o Queijo do Reino.
Características
O Queijo Reino tradicional apresenta-se mais seco e firme, de sabor pronunciado e coloração mais intensa, apresentando textura fechada à pequenas olhaduras, ovaladas, regulares e distribuídas. Atualmente elabora-se um queijo de tendência a sabor mais suave e massa mais elástica, utilizado para consumo de mesa, incluindo fatiamento. Naturalmente, apresentamos aqui, duas vertentes diferenciadas de um mesmo produto para consumidores também diferenciados.
Tecnologia atual – adaptada segundo as boas práticas de fabricação:
Utilização de leite pasteurizado (72ºC/ 15 segundos) em sistema de pasteurização HTST (placas) ou 65ºC por 30 minutos (sistema ainda permitido em alguns estados) e gordura previamente regulada para 3.4%.
Demais ingredientes: Cloreto de Cálcio (sol. 40% m/m na dosagem de 50 ml para cada 100 litros);
Nitrato de Sódio (dosagem de 20 gramas para cada 100 litros);
Corante natural de urucum (dosagem de 8 ml para cada 100 litros);
Fermento lático composto de Lactobacillus helveticus.
Temperatura de coagulação: 32 a 34ºC com adição de coagulante na dosagem comercial (exemplo 20 ml para cada 100 litros de leite).
Os ingredientes devem se adicionados na seguinte ordem: adição do fermento lácteo no leite em temperatura regulada para 32 a 34ºC e pré maturação por um período de 30 a 40 minutos seguido da adição do Nitrato de Sódio, Corante de Urucum, Cloreto de Cálcio e por último o coagulante previamente diluído em água não clorada.
Após a coagulação (tempo médio de 35 a 50 minutos) o coágulo deve ser cortado em grãos 3 (queijo mais úmido) que corresponde a um grão de 1 cm de aresta (grão de milho) ou grão 4 (queijo mais seco e firme) que corresponde a um grão de 0,5 cm de aresta (grão de arroz), com auxílio das liras vertical e horizontal. Após o corte a massa deve permanecer em repouso por um período de 5 minutos, seguidos por mexedura lenta por um período de 15 a 20 minutos.
Após a primeira mexedura, fazer a retirada de cerca de 35 a 40% de soro e fazer adição de água na temperatura regulada para 75ºC, adicionando lentamente (preferencialmente em sistema de chuveiro), até que a massa atinja a temperatura de 45ºC (o que equivale a aproximadamente a dosagem de 20 a 25% de água a 75ºC), via de regra este aquecimento deve ser lento ( 20 minutos) sob agitação constante e intensa e poderá ser complementado com vapor indireto na camisa do tanque, dependendo das condições ambientais de temperatura.
O ponto da massa pode variar em um tempo de 60 a 70 minutos decorridos após o corte da massa e apresenta determinada consistência, grãos arredondados, soltos e coesos quando delicadamente comprimidos com a mão. O soro apresenta tonalidade esverdeada e um certo “aroma”, já pela fermentação lática.
Após o ponto a massa deverá ser pré-prensada no tanque de fabricação e auxílio das placas de pré-prensagem e peso relativo ao dobro do peso da massa, por um período de 20 minutos em presença de soro. A acidez do soro ao final do processo poderá apresentar-se em torno de 14ºD (graus Dornic). Decorridos a pré-prensagem a massa deverá ser enformada em formas apropriadas e características deste tipo de queijo (revestidas com dessoradores), formato esférico com peso final de 2,2 a 2,4 quilos (objetivando um queijo após o período de maturação com 1,8 kg).
Após a enformagem os queijos deverão ser prensados em prensas pneumáticas seguindo os respectivos valores e procedimentos: 25 a 30 lbs/pol² por 20 minutos (virar e acertar os queijos); 35 a 40 lbs/pol² por 90 minutos (desligar o ar comprimido e manter os queijos na prensa até o dia seguinte); 30 lbs/pol² por 20 minutos (retirar os queijos das formas, retirar as rebarbas e prensar sem dessorador).
Decorridos a prensagem no dia seguinte, os queijos deverão ser destinados para a salga em sistema de salmoura (regulada para 10 a 12ºC com 20% de sal que corresponde a 19º Baumè) por um tempo de 48 a 60 horas. Após o período de salga os queijos devem ser destinados para a etapa de secagem por um período mínimo de 48 horas de forma que ao serem destinados para câmara de maturação, não levem consigo a umidade da salmoura.
Maturação
Na região produtora do Queijo Reino, mesma região de sua origem, ainda se conserva em algumas pequenas indústrias o formato de maturação em temperatura ambiente (o clima brando o permite) em locais denominados regionalmente por “pindoba” . Os queijos permanecem toda a maturação (tempo médio de 30 a 40 dias) nestes locais e normalmente não são submetidos a nenhum tratamento, a não ser viragens períodicas, período findo o qual são lavados e/ou raspados, pintados e envasados em latas, após uma classificação própria.
Nos últimos 20 anos, o Queijo Reino e sua produção vêm sofrendo algumas modificações, a princípio por uma própria mudança nos hábitos de consumo (normalmente vem se ofertando queijos mais suaves), por outro, pela imposição de novos critérios de produção regulamentados pela legislação pertinente e algumas exigências que podem confrontar com os sistemas mais tradicionais de produção. Não poderíamos ainda de relatar o fator econômico que muitas vezes influenciou no sistema de maturação de queijos, alterando definitivamente a característica do produto final. De toda forma apresentamos aqui, um formato de maturação para indústrias que queiram implantar o Queijo Reino.
Após a etapa de secagem os queijos devem ser destinados para câmara de maturação, cuja a temperatura deve ser regulada para 14ºC e umidade relativa do ar 85%. Os queijos devem ser virados diariamente de forma apresentarem o mesmo grau e homogeneidade de ressecamento em sua crosta. O período de maturação para um queijo de 1,8 Kg (peso padrão) exposto ao ambiente via de regra é de 35 a 40 dias, maturando por mais alguns dias após a embalagem, normalmente totalizando 60 dias. Atualmente o sistema de maturação para queijos é cercado de procedimentos técnicos de forma a evitar uma perda excessiva de umidade consequentemente de peso, tornando o produto final mais oneroso e menos competitivo. Estes tratamentos compreendem desde um controle rigoroso de temperatura/ umidade da câmara maturação, viragens regulares, esterilização do ar da câmara de maturação utilizando deionizadores, tratamentos com resinas anti-fúngicas, etc.
Tradicionalmente os queijos após o período de maturação são raspados (verdadeiramente torneados) ou lavados e submetidos a pintura com corante vermelho (fucsina ou magenta 2 a 3% em solução 50% água/ álcool) ou corante natural carmim de cochonilha a 3%. Os queijos podem ser classificados em função do tipo de embalagem que serão envasados. Para embalagens em lata (folha de Flandres), o queijo não deve apresentar nenhum indicativo de formação de gás, que tende a ser um defeito não desejado, principalmente pelo fato do queijo ser normalmente comercializado em temperatura ambiente. Os queijos não aptos para embalagem em lata são frequentemente envasados em filme plástico à vácuo em peças inteiras ou fatiados. O rendimento do Queijo Reino, é relativo em função da qualidade de leite, sistema de produção, tipo de massa (umidade a ser obtida), maturação, etc. Via de regra, gastam-se de 10 a 11 litros de leite para se elaborar um quilo de queijo.