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Queijo e Saúde

Dra Licinia de Campos, nutricionista 
Informativo Leite & Saúde
Edição Nº 37/10 – Queijos e Saúde

Queijos são alimentos com contribuição apreciável para a saúde humana, devido à quantidade de nutrientes disponíveis neles. Os queijos possuem uma longa história na dieta humana, por muito tempo representou a forma primária concentrada do leite, com o benefício de uma vida de prateleira prolongada.

O alto teor de gorduras e proteínas dos queijos torna-os um alimento rico em energia e nutritivo, apropriado para o trabalho duro de nossos ancestrais.

Os avanços recentes na ciência da nutrição ilustraram a contribuição do queijo para a nutrição e saúde. O queijo é uma fonte rica de nutrientes essenciais, em particular, proteínas, peptídeos bioativos, aminoácidos, ácidos graxos, vitaminas e minerais.

O queijo maturado é livre de lactose e portanto adequado à nutrição dos indivíduos intolerantes à lactose. Há evidências que sugerem que os 2 tripeptídeos bioativos, VPP E IPP, encontrados no leite azedo fermentado com Lactobacillus helvetius, diminuem a pressão arterial.

A alta concentração de aminoácidos essenciais no queijo contribui para o crescimento e desenvolvimento do organismo humano. Mesmo com a presença de quantidades notáveis de gorduras saturadas e trans, não há evidências claras relacionando o consumo de queijos a qualquer doença.

O ácido conjugado linoléico e os esfingolipídeos presentes no queijo podem ter propriedades anti-carcinogênicas. A alta concentração de cálcio no queijo é bem conhecida por contribuir para a formação e manutenção de ossos e dentes fortes, como também demonstra um efeito positivo na pressão arterial e ajuda a manter o peso em combinação com dietas de baixo teor energético.

O queijo é um produto lácteo importante e parte integral de dieta saudável, devido à sua contribuição substancial à saúde humana.

Composição do queijo e nutrição

Os vários tipos de queijos podem ser classificados de acordo com o tipo de leite usado (vacas, búfalas, cabras, ovelhas, etc), sua manufatura (coalho, queijo de leite azedo, ultrafiltração), consistência (extra-duro, duro, semi-duro, semi-mole, mole, queijo fresco), teor em gordura, tipo de fermentação (ácido láctico, láctico e ácido propiônico, ácido butírico), superfície (dura, mole, c/ manchas, fungos) e interior (olhos, fungos). Diferem em sabor e em componentes bioativos, criados principalmente durante os diversos estágios de maturação, quando os ingredientes principais (lactose, proteínas e gorduras) são quebrados pela fermentação, proteólise e lipólise. Portanto, as variedades de queijos no mercado são enormes.

As proteínas do queijo são constituídas em grande parte pela caseína, com pequenas quantidades de alfa-lactalbumina e beta-lactoglobulina. Juntas, estas proteínas respondem por 1/5 das proteínas do leite original. Um quinto das proteínas do leite, a maioria albuminas e globulinas solúveis, permanecem no soro do leite. O método de coagulação do leite, assim como o grau de maturação (exemplo: coagulação enzimática ou coagulação por ácidos), influenciam o teor em proteínas do queijo. Em queijos duros maturados, como o Cheddar ou Suíço, ocorre pouca hidrólise de proteínas, enquanto que nos queijos moles maturados, como Camembert, as proteínas são quebradas em compostos hidrossolúveis. O que inclui peptídeos, aminoácidos e amônia.

A proteína do queijo é classificada como de alto valor e qualidade por conta de sua composição única em aminoácidos. O queijo contém todos os aminoácidos encontrados em alimentos protéicos, e em quantidade significativa.

O relativo destaque de um dos aminoácidos dietéticos, a lisina, nas proteínas do queijo torna-o valioso na suplementação das proteínas vegetais, especialmente as de origem de grãos, pobres em lisina.

O teor em carboidrato, chamado de lactose, em queijos maturados não é nutricionalmente significativo. A lactose é removida em grande parte com o soro do leite durante o preparo do queijo. A presença de pequenas quantidades (2%) depende da quantidade aprisionada pelo soro de leite no molde. Durante a maturação, esta lactose é transformada geralmente em ácido láctico e outros produtos pelas bactérias, fungos, mofos, fermentos e enzimas produtores do sabor característico do queijo em questão. Após 21 a 28 dias de maturação, em geral não resta nada da lactose.


O queijo e seus aspectos em saúde

O queijo é uma fonte rica de cálcio biodisponível. A maioria das discussões a respeito do aspecto saudável do queijo aborda este mineral em específico, mas ao mesmo tempo, os papéis específicos exercidos pelos outros ingredientes como proteínas, peptídeos bioativos, CLA e esfingolipídeos não podem ser ignorados.


1. Efeito protetor nas cáries dentárias

As cáries dentárias aparecem devido à quebra do esmalte dentário pelos ácidos formados durante a fermentação dos açúcares e amidos pela placa bacteriana. Mesmo com a otimização de sua incidência, devida à melhor profilaxia, as cáries ainda são a doença dental mais prevalente. Para evitar a corrosão do esmalte dentário, a boa higiene é de grande auxílio. Embora o leite contenha açúcar (lactose), estudos em animais e humanos demonstraram que não é carcinogênico. O leite reduz mesmo as cáries em ratos quando adicionado à dieta normal. Por outro lado, cálcio e fósforo parecem minimizar a queda do pH pela placa, o que significa que a produção dos ácidos após o consumo de lácteos é reduzida. Mastigar um pedaço de queijo após um alimento açucarado traz o pH de volta à neutralidade rapidamente. Neste caso, os queijos maturados parecem proteger melhor que os queijos jovens e frescos. Uma explicação para a proteção poderia ser o efeito do tamponamento pela estimulação do fluxo salivar pelo queijo. A saliva contém íons de cálcio e fosfato em super-saturação, o que leva à mineralização do esmalte pelo meio ambiente neutro.


2. Redução do peso ou efeitos anti-obesidade

A obesidade é um risco à saúde já estabelecido, aumentando o risco de doenças cardiovasculares, hipertensão, diabetes e alguns tipos de câncer, assim como anormalidades metabólicas. As causas principais desta doença epidêmica são nutrição deficiente, atividade física mínima, fatores do estilo de vida assim como fatores sociais, culturais e de predisposição genética.

Mulheres com sobrepeso parecem ser o grupo que melhor se beneficia da ingestão do queijo. O teor em cálcio do alimento parece exercer papel importante nesta relação. O cálcio tem correlação negativa ao passo que a ingestão de vitamina A tem correlação positiva com mudanças no peso corporal total e gordura corpórea. Indivíduos com alta ingestão em cálcio, equacionada na ingestão energética total, e baixa ingestão em vitamina A ganharam menos peso e gordura no período de 2 anos em um experimento intervencional randomizado.

O mecanismo exato ainda é incerto, mas pode ser devido parcialmente à formação de complexos de cálcio e ácidos graxos no intestino, prevenindo sua absorção. O cálcio dietético suprime o calcitriol, estimula a lipólise e diminui o acúmulo de adipócitos. Além disso, o leite e o queijo são ricos em proteínas, o que os liga com o aumento em saciedade relativa, ajudando dietas com valor calórico restrito. A ingestão energética diária total é significativamente maior quando alimentos ricos em carboidratos, gorduras e proteínas são ingeridos na forma líquida ao invés de sólida. No entanto, outros compostos bioativos nos produtos lácteos tais como o CLA podem ter também influência no controle do peso e da composição corporal.


3. Propriedades anti-hipertensivas

No Ocidente a hipertensão é um dos fatores de maior risco para doenças cardiovasculares e AVCs. Em vários estudos, os produtos lácteos mostraram efeito benéfico na pressão arterial, especialmente nos indivíduos com hipertensão suave. Dois componentes principais parecem ser relevantes à esta situação: cálcio e peptídeos bioativos.

A relação inversa entre ingestão em cálcio e pressão arterial foi sugerida em 1º lugar por várias pesquisas epidemiológicas no começo dos anos 80, porque populações com baixa ingestão em cálcio tinham prevalência maior de hipertensão. Investigações laboratoriais e clínicas subsequentes forneceram evidências posteriores para a associação entre cálcio e pressão arterial, mas os resultados destes estudos foram inconsistentes.

Além do cálcio, potássio e magnésio também parecem ter efeito benéfico na pressão arterial. Esta é a explicação do porquê os produtos lácteos, boas fontes desses 3 minerais, são recomendados para alcançar as necessidades diárias recomendadas (RDA) em cálcio. Estudos publicados recentemente confirmam os achados acima mencionados e demonstram o efeito benéfico dos vários produtos lácteos na pressão arterial.

O queijo é uma fonte rica em peptídeos bioativos. Entre estes peptídeos, um das funções mais interessantes e investigadas biologicamente, é a enzima conversora-angiotensina (ACE) de efeito inibidor. ACE é uma enzima-chave na regulação da pressão arterial, porque permite a conversão da angiotensina I à angiotensina II, com efeito vasoconstritor altamente potente e inativador da ação depressora da bradiquinina. Ao inibir o efeito da ACE, estes peptídeos têm influência positiva na hipertensão, embora seu efeito seja menos pronunciado do que o efeito das drogas baseadas nos mesmo princípios.

Entre os peptídeos inibidores da ACE, os tripeptídeos VPP e IPP pertencem aos mais potentes do grupo dos inibidores da ACE. São facilmente absorvidos pelo intestino. VPP e IPP estão codificados na beta-caseína do leite. As proteinases da bactéria ácido láctica L. Helveticus têm o potencial de liberar estes 2 peptídeos no leite fermentado. O fato é que o L. Helveticus é uma cepa comum usada no preparo de queijos, e que durante a maturação acontece intensa proteólise, assim o queijo pode também mostrar atividades inibidoras da ACE devido à formação de VPP e IPP.


4. Efeito benéfico na sáude óssea

O papel do cálcio na saúde óssea é bem documentado e reconhecido. Como já demonstrado, o queijo pode fornecer quantidades significativas em cálcio, especialmente para a dieta dos indivíduos intolerantes à lactose. Além do cálcio, outros componentes do queijo como o magnésio e a vitamina D e mesmo alguns peptídeos bioativos podem exercer papel importante na construção da densidade mineral óssea e na perda redutora óssea.


5. Efeitos anti-carcinogênicos

O consumo de queijos foi relacionado com câncer colorretal e de próstata. Contudo, a ocorrência de câncer de próstata e cálcio somente é correlacionada com dietas bem ricas em cálcio, provável causa do câncer de próstata. De acordo com um painel realizado, há evidências limitadas de que o alto consumo de leite e produtos lácteos seja a causa real do câncer de próstata. Estes conclusões podem ser explicadas pela presença de compostos anti-carcinogênicos tais como CLA e esfingolipídeos no queijo. É sabido que o CLA está envolvido em várias etapas dos 3 estágios da carcinogênese, deletando seus efeitos pela modulação da proliferação e apoptose celular, regulação da expressão gênica, influência da síntese e metabolismo dos eicosanóides, e mecanismo anti-oxidativo.

Outro grupo interessante de lipídeos relacionados com a prevenção do câncer são os esfingolipídeos. Não há experimentos humanos ou estudos epidemiológicos avaliando o efeito protetor no desenvolvimento e progressão do câncer de cólon. Baseando-se no fato de que os esfingolipídeos reduzem os marcadores de câncer de cólon em experimentos animais e que os seus metabólitos induzem a morte celular espontânea em células cancerígenas humanas, é altamente provável que os esfingolipídeos tenham propriedades anti-carcinogênicas em humanos.


Tabela comparativa dos teores de caloria, gordura e colesterol de diversos tipos de queijos (em 100 gramas) – Fonte: www.queijosnobrasil.com.br

Queijos  Calorias (Kcal) Gordura (%) Colesterol (mg)
Minas frescal 75 16 – 18 10
Mussarela 85 20 – 24 25
Ricota 50 8 – 12 15
Cottage cheese 30 0,5 – 4 5
Queijo fundido 100 24 – 32 25
Prato (Lanche) 105 28 – 32 25
Requeijão 105 24 – 36 35

Referências bibliográficas:
• www.queijosnobrasil.com.br.

• www.cheesematters.com.au. All about cheese. Cheese and nutrition.

• Miller GD et al. Handbook of Dairy Foods and Nutrition. 2nd ed. 2000;

• www.nutritionexplorations.org. Cheese: a nutrition plus for schools.

• BBC News: Cheese and milk: recipe for a healthy heart? July, 1998;

• www.news-gazette.com – Eating cheese may offer health benefits for the elderly, 2010;

• www.nutraingredients.com. CLA-rich cheese may boost heart health: study. Stephen Daniells. 2009.

• Law, Barry. Microbiology and biochemistry of cheese and fermented milk. Ed Chapman & Hall. 2nd Ed. 1997.

• Barham, Peter. The science of cooking. Ed. Springer. 1950.

• www.ital.sp.gov.br. Probióticos e prebióticos em queijos. Seminário Tecnolactea. 2009.

• Furtado, MM. A arte e a ciência do queijo. Ed. Globo. 2ª Ed. 1991.

• www.eufic.org. Queijo: uma tradição européia.

• Walther, Barbara et all. Cheese in nutrition and health. Dairy Sci. Technol. 88 (2008) 389 – 405. EDP Sciences,2008.

* Licinia de Campos Graduada em Nutrição (Universidade São Judas Tadeu) com formação autodidata em Gastronomia; pós-graduada em Gestão de Negócios de Serviços de Alimentação (SENAC); curso de especialização em Docência e Didática para Ensino Superior em Turismo e Hotelaria (SENAC); curso de Auditor Líder ISO 22000 (Food Design); ex-redatora do Suplemento Feminino do jornal “O Estado de SP”; Seminário de Antropologia Alimentar : “Alimentation et hiérarchies sociales et culturelles” pelo IEHCA em Tours, França; participante do programa “Com Sabor” da Rede Mulher por 3 anos; tradutora de diversos fascículos e livros para a Editora Globo; consultora gastronômica- nutricional do site SIC (Serviço de Informação da Carne); palestrante especializada em Gastronomia e Nutrição; redatora da revista NutriNews ; docente em vários cursos das unidades SENAC ; Consultora e Assessora Especializada em Gestão Operacional Administrativa de Unidades Alimentares.